Ontem, terça feira (10/10), a modelo Lola Ogunyemi deu entrevista ao Jornal britânico "The Guardian", se manifestando sobre a repercussão mundial da campanha desastrosa da Dove. Entre outros trechos emocionantes, a modelo disse "Há definitivamente algo a ser dito aqui sobre como os anunciantes precisam olhar além da superfície e considerar o impacto que as imagens podem causar, especificamente quando se trata de grupos marginalizados de mulheres."
Algumas coisas importantes precisam ser levadas em consideração, na hora de analisar mais de perto a campanha da Dove e, com certeza, uma que não pode passar desapercebido é a importância da análise de discurso subjetivo, na leitura de uma campanha publicitária. É possível perceber, e também como a própria modelo disse, fora do contexto e do filme completo, que teria cerca de trinta segundos, a campanha é totalmente racista, mas, olhando o todo, a coisa não seria bem assim.
O que me chama séria atenção é, faria total diferença caso a empresa tivesse diversidade em sua equipe, pois, qualquer pessoa negra conseguiria ter o olhar de "olha, talvez isso não pegue bem!", o que obviamente não aconteceu e essa campanha racista foi ao ar.
Lola foi bem incisiva em sua entrevista, no sentido de deixar claro que ela não estaria ali se soubesse do resultado e não esteve ali como vítima, ela é uma modelo, este é o trabalho dela, agora o trabalho mal feito da edição atingiu, não só a ela, mas uma parcela imensa da população.
"Eu sou uma mulher nigeriana, nascida em Londres e criada em Atlanta. Cresci muito consciente da opinião da sociedade de que as pessoas de pele escura, especialmente as mulheres, ficariam melhores se a nossa pele tivesse um tom mais leve.
Eu sei que a indústria da beleza alimentou essa opinião com sua longa história de apresentar modelos brancas ou mestiças como padrão de beleza. Historicamente, e em muitos países, ainda hoje é assim. Modelos mais escuras são usadas para demonstrar as qualidades de clareamento da pele de um produto.
Essa narrativa repressiva eu vi afetar mulheres de muitas comunidades diferentes das quais fiz parte. E é por isso que, quando a Dove me ofereceu a chance de ser o rosto de uma nova campanha de sabonete líquido, eu topei.
Ter a oportunidade de representar minhas irmãs negras para uma marca de beleza global me pareceu a maneira perfeita de lembrar ao mundo que estamos aqui, somos lindas e, mais importante, somos valorizadas.
Então, uma manhã, acordei com uma mensagem de um amigo perguntando se a mulher em um post que ele tinha visto era realmente eu. Entrei na internet e descobri que eu me tornara o cartaz involuntário de uma propaganda racista. Não estou mentindo.
Se você digitar “anúncio racista” no Google agora mesmo, uma foto do meu rosto é o primeiro resultado. Eu estava entusiasmada por fazer parte do comercial e promover a força e a beleza da minha raça, então isso era perturbador.
Apelos estavam sendo feitos para boicotar a Dove e amigos de todo o mundo estavam me procurando para ver se eu estava ok. Fiquei impressionada com o quão controverso o anúncio se tornou.
Se eu tivesse a menor suspeita de que eu seria retratada como inferior, ou como “antes” em uma propagada de antes e depois, eu teria sido a primeira a dizer um “não” enfático. Eu teria ido embora. Isso é algo que vai contra tudo o que acredito.
No entanto, a experiência que tive com a equipe Dove foi positiva. Eu tive momentos maravilhosos no set. Todas as mulheres na filmagem entenderam o conceito e o objetivo – usar nossas diferenças para destacar o fato de que toda pele merece gentileza.
Lembro-me de todas nós entusiasmadas com a idéia de usar camisetas e nos transformarmos umas nas outras. Não estávamos certas de como a edição final iria ficar, nem qual de nós seria realmente apresentada, mas todas pareciam estar alegres, inclusive eu.
Então, o primeiro anúncio no Facebook foi lançado: um videoclipe de 13 segundos comigo, uma mulher branca e uma asiática. Eu amei. Meus amigos e familiares adoraram. As pessoas me parabenizaram por ser a primeira a aparecer, por estar fabulosa. Eu estava orgulhosa.
O comercial de TV completo de 30 segundos foi lançado nos EUA e eu estava novamente na lua. Havia sete de nós na versão completa, raças e idades diferentes, cada uma respondendo a mesma pergunta: “Se sua pele fosse uma etiqueta de lavagem, o que ela diria?”
Repetindo, eu era a primeira modelo no anúncio, descrevendo minha pele como “20% seca, 80% brilhante” e aparecendo novamente no final. Adorei, e todos à minha volta pareciam bem. Eu acho que a edição completa da TV era muito melhor para deixar a mensagem da campanha clara.
Há definitivamente algo a ser dito aqui sobre como os anunciantes precisam olhar além da superfície e considerar o impacto que as imagens podem causar, especificamente quando se trata de grupos marginalizados de mulheres. É importante examinar se o seu conteúdo mostra que a voz do seu consumidor não é apenas ouvida, mas também valorizada.
Posso entender como as fotos que estão circulando na web foram mal interpretadas, considerando o fato de que a Dove enfrentou uma reação no passado pelo mesmo problema.
Há uma falta de confiança aqui, e eu sinto que o público estava certo em sua indignação inicial. Dito isso, também vejo que muito foi deixado de fora. A narrativa não forneceu aos consumidores um contexto no qual basear uma opinião.
Embora eu concorde com a resposta da Dove de se desculpar inequivocamente por qualquer ofensa causada, eles também poderiam ter defendido sua visão criativa e sua escolha de me incluir, uma mulher negra, como o rosto de sua campanha.
Eu não sou apenas uma vítima silenciosa de uma campanha de beleza equivocada. Sou forte, sou linda e não vou ser apagada". (The Guardian)
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