A história ancestral negra é marcada pela oralidade. Assim construímos e solidificamos tradições ao longo dos anos, inclusive os anos de escravidão, tráfico, torturas, violências e depois sobrevivendo ao genocídio, apagamento cultural, políticas de embranquecimento e etc... A oralidade foi e vem sendo a maneira que os negros que foram sequestrados pra cá, ou os que nasceram aqui, encontraram de resistir e fazer sobreviver a nossa cultura.
Por outro lado também vemos a necessidade de registrar nossas histórias ou, como diria Conceição Evaristo, cresce a necessidade e emergência das nossas Escrevivências. A importância da escrita negra vem sendo cada vez mais percebida e, note, estou longe de falar apenas sobre a escrita acadêmica.
Unicamp, dita por algumas pessoas como "a casa grande da acadêmia", incluiu o álbum Sobrevivendo ao inferno, de 1990, à leitura obrigatória para o vestibular de 2020.
Ainda causa espanto para algumas pessoas, que um álbum longe de ser considerado clássico entre para a lista de um vestibular tão concorrido como o da Unicamp, mas, para repetir as palavras do coordenador executivo da comissão organizadora do exame (Comvest), José Alves de Freitas Neto, que também é professor de História: "As críticas feitas neste álbum permanecem atuais".
Para além de entrar para a lista de um dos vestibulares mais disputados do país, o que pode ser fácil para qualquer pessoa medíocre que não seja atingida pelo racismo, a escrita negra tem vários outros aspectos relevantes. A reconstrução da nossa autoestima, por exemplo, pode ter como ferramenta o que homens e mulheres negras vem escrevendo nos últimos tempos. Escrevendo com a planejada intenção de ser voz para uns que ainda não tem coragem de se expressar, ou ser apoio para outros que ainda se sentem sozinhos em meio as pauladas que o racismo nos dá, dia após dia.
Músicas, sambas-enredo, filmes, peças de teatro, blogs, canais de comunicação em geral, livros, teses e dissertações tem sido cada vez mais escritas por homens e mulheres negros. Isso significa começar a subverter uma ordem que aparentemente estava dada e era isso mesmo que ia acontecer... Mas, talvez não. Talvez nós tenhamos o que falar sobre nós.
Recentemente ouvi de uma amiga, que está no meio de seu doutorado, críticas pesadas à sua própria escrita. Ela repediu algumas vezes sobre como "escrevia mal" e sobre ter ciência da própria dificuldade de escrita. Procurei ouvir, porque era o papel que me cabia na hora. Mas, duvido muito que uma mulher, negra e com um grande pacote de particularidades em sua história, tenha chegado aonde ela está "escrevendo mal". Isso não é um luxo ao qual uma pessoa negra pode se dar. Se ela de fato "escrevesse mal", sou capaz de apostar que ela não estaria neste lugar dentro da academia.
O que acontece, e muito, é que somos constantemente tomados pela nossa oralidade. E, oras, não há como se afastar daquilo que é essencialmente nossa marca cultural, nossa origem. É difícil se desfazer completamente das suas origens, principalmente se for para cumprir uma agenda de exigências eurocêntricas que tentam a todo custo embranquecer nossas escritas para tolerá-las.
A nossa missão passa a ser então, conciliar nossa maneira de Escreviver nossas histórias e registrar nossa marca para além da oralidade, na escrita. Sem deixar, no entanto, de marcar a nossa existência também nessa parcela da história. Como diria Lélia Gonzales, homens e mulheres negras ao falarem "assumem um risco", mas, um risco extremamente importante ao meu ver.
Podemos hoje registrar em jornais, revistas, livros, trabalhos acadêmicos, blogs, canais de vídeo e outras tantas formas de produzir História, a nossa própria marca, a nossa própria maneira de viver e ver o que acontece conosco. Para, num futuro breve, inaugurar uma nova leva de documentos em que estejamos nós mesmos falando de nós. Escrever, para homens e mulheres negros, é mais que colocar de maneira ordenada palavras no papel, é registrar de maneira fiel e próxima, aquilo que sabemos que é a nossa própria História.
Para além de entrar para a lista de um dos vestibulares mais disputados do país, o que pode ser fácil para qualquer pessoa medíocre que não seja atingida pelo racismo, a escrita negra tem vários outros aspectos relevantes. A reconstrução da nossa autoestima, por exemplo, pode ter como ferramenta o que homens e mulheres negras vem escrevendo nos últimos tempos. Escrevendo com a planejada intenção de ser voz para uns que ainda não tem coragem de se expressar, ou ser apoio para outros que ainda se sentem sozinhos em meio as pauladas que o racismo nos dá, dia após dia.
Músicas, sambas-enredo, filmes, peças de teatro, blogs, canais de comunicação em geral, livros, teses e dissertações tem sido cada vez mais escritas por homens e mulheres negros. Isso significa começar a subverter uma ordem que aparentemente estava dada e era isso mesmo que ia acontecer... Mas, talvez não. Talvez nós tenhamos o que falar sobre nós.
Recentemente ouvi de uma amiga, que está no meio de seu doutorado, críticas pesadas à sua própria escrita. Ela repediu algumas vezes sobre como "escrevia mal" e sobre ter ciência da própria dificuldade de escrita. Procurei ouvir, porque era o papel que me cabia na hora. Mas, duvido muito que uma mulher, negra e com um grande pacote de particularidades em sua história, tenha chegado aonde ela está "escrevendo mal". Isso não é um luxo ao qual uma pessoa negra pode se dar. Se ela de fato "escrevesse mal", sou capaz de apostar que ela não estaria neste lugar dentro da academia.
O que acontece, e muito, é que somos constantemente tomados pela nossa oralidade. E, oras, não há como se afastar daquilo que é essencialmente nossa marca cultural, nossa origem. É difícil se desfazer completamente das suas origens, principalmente se for para cumprir uma agenda de exigências eurocêntricas que tentam a todo custo embranquecer nossas escritas para tolerá-las.
A nossa missão passa a ser então, conciliar nossa maneira de Escreviver nossas histórias e registrar nossa marca para além da oralidade, na escrita. Sem deixar, no entanto, de marcar a nossa existência também nessa parcela da história. Como diria Lélia Gonzales, homens e mulheres negras ao falarem "assumem um risco", mas, um risco extremamente importante ao meu ver.
Podemos hoje registrar em jornais, revistas, livros, trabalhos acadêmicos, blogs, canais de vídeo e outras tantas formas de produzir História, a nossa própria marca, a nossa própria maneira de viver e ver o que acontece conosco. Para, num futuro breve, inaugurar uma nova leva de documentos em que estejamos nós mesmos falando de nós. Escrever, para homens e mulheres negros, é mais que colocar de maneira ordenada palavras no papel, é registrar de maneira fiel e próxima, aquilo que sabemos que é a nossa própria História.
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