23 dezembro 2015

APROPRIAÇÃO CULTURAL: A NOSSA CULTURA ESTÁ NA MODA E NÓS?

Muito se ouviu falar em apropriação cultural em 2015, principalmente das outras etnias em relação a cultura afro em geral. Em muitas das discussões as pessoas usam como argumento o bom e velho "eu uso o que eu quiser" e, com estas pessoas, realmente fica difícil desenvolver qualquer discussão com mínimo de nível mas vamos tentar discutir de forma saudável? 
Quando ouvir falar de apropriação cultural esqueça o "não posso", ninguém está dizendo o que você pode ou não pode fazer. Vivemos em um país democrático em que, desde que você não infrinja as leis, pode fazer o que você quiser não é mesmo? Não existe nenhuma lei até agora que proíba pessoas não-negras de usarem dreads, tranças ou turbantes.
Mas se não há lei que me proíba e eu posso fazer o que eu quiser, porque não usar?
Primeiro de tudo, eu sei que não adianta apelar para senso de justiça ou bom senso de pessoas racistas porque elas simplesmente NÃO TEM essa pecinha na cabeça, mas ajudar a população negra a entender e fortalecer os seus argumentos sobre estas discussões é de extrema importância (aliás este blog existe para isto: empoderamento negro). Pessoas racistas e preconceituosas geralmente só pensam no próprio umbigo e são incapazes de tentar problematizar algo considerando a vivência do outro. Para uma pessoa racista, se a Thaís Araújo é negra e faz sucesso significa que todas as pessoas negras podem ter o mesmo sucesso dela e, se ainda não tem, é porque não estão se esforçando o suficiente. 
Segundo, avalie muito bem se vale mesmo a pena e é completamente necessário entrar na discussão sobre apropriação cultural com uma pessoa racista / preconceituosa / umbiguista porque certamente isso será desgastante e muito, muito longo. Você precisa ter certeza de que vale a pena começar aquela discussão e que aquela pessoa que você vai discutir é suficientemente importante para você, do contrário, deixe o racista falando sozinho!
Então vamos aos fatos, a nossa estética atualmente está na moda, todas as pessoas querem colocar um pano/lenço na cabeça e chamarem de turbante, só porque algum fashionista disse que esta palavrinha torna qualquer pano na cabeça mais chique, usar estampas étnicas vindas da África para parecer "in", usar dreads porque acha "moderninho" ou frequentar o candomblé/umbanda porque viu numa reportagem que é a "nova religião dos jovens descolados". Mas, antes de alguém dizer que isso ou aquilo era "moda", o que é as pessoas racistas achavam disto hein? Candomblé era "do demônio", Dread era "coisa de mendigo", turbante era "coisa de macumbeiro" e por ai vai... E agora tudo é "cool". Apropriar-se da cultura do povo negro no mínimo é desonesto porque você pode achar lindo levar um "turbante" para casa, mas levar todos os prejuízos sociais que nós carregamos dia e noite, quem quer? "Mas Lívia, turbante não é só dos negros, os árabes também usam"... Eu particularmente adoro esse argumento, porque parece que a pessoa não faz ideia de que os países árabes ficam no continente africano (às vezes nem fazem mesmo, rs), ou às vezes acham que a Africa é só um país, vai entender...
E, mesmo que em uma hipótese remota, o Marrocos (por exemplo) não fizesse parte do continente africano, você, pessoa que não nasceu nasceu no Marrocos ainda estaria se apropriando de uma cultura que não é sua não é mesmo? 
Por anos, o povo negro no Brasil foi obrigado a negar as suas raízes e esconder tudo o que remeterá a mãe África (já falamos sobre a política de embranquecimento do Brasil aqui no blog) portanto, tudo que faz parte da nossa cultura até bem pouco tempo era considerado sujo, impuro ou "motivo de vergonha" e de uma hora para outra virou "modinha entre a turma antenada". E não bastasse toda a problemática em volta disto, temos o principal que é a inviabilização do negro, quer exemplos? Negro de turbante - macumbeiro (e isso não é ruim, ruim é significado pejorativo que a sociedade racista atribui às religiões de matrizes africanas), Branco de turbante - fashion; Negro de dread - sujo, Branco de dread - fashion; Negro no candomblé / Umbanda - adorador de demônios, branco nestas religiões - fashion. Entenderam agora qual o problema da apropriação cultural? Foi nesta mesma linha que nossos heróis foram embranquecidos e invisibilizados e isso NÃO ESTÁ LIBERADO! 

O problema básico da apropriação cultural na minha visão é quando nós somos considerados não tão bons para usar algo ou alguma coisa. Em um negro, aquilo carrega significado pejorativo e em uma pessoa branca no Brasil por exemplo, aquilo passa a ter um significado muito mais bonito, atrativo e é isto que é combatemos. Se ainda assim, o racista achar bonito sair por aí "fantasiado" de negro, é um problema que nós não conseguiremos resolver mas não é por isso que deixaremos de questionar e com argumentos sólidos! O nosso povo tem cultura, tem história e é tudo muito lindo portanto, vamos nos apropriar do que é nosso!

2 comentários:

  1. Branco na Umbanda é apropriação cultural? Em todos os casos?

    Olorum me livre. Agora querem​ regulamentar quem deita pra orixá.

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    1. Olorum me livre, depois de um texto desse tamanho, ainda ter que explicar que não tem a ver com "vontade" ou "poder x não poder"!

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