28 fevereiro 2019

A NAMORADA TEM NAMORADA. E UM FILHO TAMBÉM.

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Há pouco tempo li um texto do Jay-Z contando sobre a mãe dele ser uma mulher lésbica, durante toda a vida e, mesmo assim, escondeu isso dos filhos para que isso não lhes causasse dor. O cantor explicou que o medo da mãe não era de que seus filhos - boas pessoas e bem criadas, sem preconceitos - lhe maltratassem ou passassem a ver a mãe com indiferença, mas sim de que as pessoas tratassem seus filhos com ódio ao descobrir que ela, a mãe deles, era uma mulher que amava outras mulheres. Jay-Z seguiu dizendo que “no fundo sempre soube”, mas esperou que a mãe o dissesse por livre e espontânea vontade sobre a sua orientação/condição sexual.

Em 2015, o garoto Peterson Ricardo de Oliveira, de 14 anos, foi assassinado por colegas de escola após se envolver em uma briga.


O estopim da confusão foi, pasmem, o fato de o garoto ser filho de um casal homoafetivo. Peterson foi espancado e morreu após quinze dias internado em estado grave.

Jay-Z passou sua infância e adolescência entre os anos 1970 e 1980 no Brooklyn, Nova York, em épocas e locais diferentes, mas, mais de trinta anos depois, é possível encontrar notícias recentes que justifiquem o medo de Gloria Carter até hoje. Então, como lidar quando a namorada tem, além de uma namorada, um filho?

A maternidade já é - sem precisar de agravantes - complicada e delicada de levar. A tarefa de criar um ser humano é muito maior e mais exaustiva do que se pode imaginar. E falando em condições de família tradicional brasileira - como querem nos fazer crer os tradicionais - já é difícil criar um ser humano isento de “traumas”, imagina então quando a família dessa criança foge ao papel social heteronormativo e padrão esperado? Bicho, que trampo! E infelizmente não existe um manual pronto de como lidar com os outros, quando a namorada é namorada da namorada e mãe… Ufa!
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A conversa deveria ser a base de todas as famílias, o diálogo franco e aberto pode ajudar - e muito - que as crianças elaborem e consigam lidar com um possível preconceito vindo de fora. A probabilidade de que o preconceito exista é alta, sabemos.. Estamos vivendo uma onda conservadora em pleno século XXI. O ano é 2019 e a prioridade do nosso atual governo é, nada mais nada menos, que ferir a laicidade do Estado, violar o direito de imagem de menores de idade e, de quebra, inserir slogan de campanha eleitoral em comunicado oficial a ser lido por funcionários públicos em exercício de sua função. É normal que estejamos preparados para o preconceito e preparemos também nossos filhos, mas,


Conversar abertamente sobre o assunto e fazer com que ele não seja um tabu - ao menos dentro de casa - vai fazer com que as crianças tenham argumentos sadios e inteligentes para discutir, se isso for preciso,

uma situação que para ela vai acabar sendo comum. Assim como Glória, é normal que muitas mulheres tomem a decisão de “esconder” de seus filhos a sua orientação/condição sexual, mas, a partir do momento que entendemos todas as formas de amor como válidas, não há porque criminalizar umas e outras não. A verdade liberta!

Outra maneira de deixar as crianças seguras em relação a relacionamentos não heteronormativos de suas mães é mostrar que, se preciso for, vamos sim acionar os meios institucionais. A escola é um dos aparelhos do Estado e, como sabemos, vai funcionar como ele. Não preciso relembrar da onda conservadora para dizer que ultimamente - mais ou menos nos últimos 500 anos - o Estado anda falhando com as pessoas negras e se esta pessoa, além de negra, for LGBT aí, meu amigo, as falhas são elevadas à décima potência. Mas, ainda assim, é preciso institucionalizar as nossas queixas na mesma medida em que o Estado institucionaliza o racismo e a LGBTfobia. O que quero dizer com isso? Estas mães devem buscar a responsabilidade de ambientes como a escola, por exemplo, em assegurar que aquela criança será tratada da mesma maneira que as outras com outros modelos de famílias. Aliás, isso vale para todos os modelos familiares que, como já dito, fogem do padrão heteronormativo. A escola tem o dever de ser um ambiente plural e seguro para que as diversidades possam conviver em harmonia. Nós não somos todos iguais e, por isso, vamos respeitar a cada um dentro da sua diferença.

Em tempos de governos autoritários, falas racistas e LGBTfóbicas institucionalizadas, perdas de direitos e retrocessos, é preciso que nós tenhamos consciência do nosso espaço, mas resistamos com inteligência, especialmente inteligência emocional. Não dá para fazer como os franceses, incendiar meia dúzia de carros e reclamar dos nossos direitos. A nossa história mostra que esse não é mais nosso perfil. No entanto, é possível que nós, que somos mães e amamos outras mulheres, cuidemos para que a geração dos nossos filhos possa não só cantar, mas entender que agora a namorada tem namorada, filho, liberdade e que deverão ser consideradas justas, de verdade, todas as formas de amor.



2 comentários:

  1. Amo seus textos Lívia!
    E fico feliz por estar compartilhando essa experiencia, me ajuda muito <3

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