O assunto de hoje é transição e para ser mais específica a
minha própria transição! No meu post sobre ‘crescimento capilar’ eu contei bem
por alto sobre este período, mas passeando pelos grupos de transição no Facebook eu sinto muita necessidade de que este assunto também seja abordado do
ângulo político! Transição não é só deixar de alisar o cabelo porque se fosse
algo simples nós faríamos isto logo e sozinhas, mas é algo complexo bem
complexo!
Nos anos que procederam à abolição da escravatura foi vista
uma “moda” surgir entre as mulheres pretas O ALISAMENTO CAPILAR, no começo eram
pastas (cremes alisantes) a base até de algo parecido com o que conhecemos hoje
como soda caustica, depois o pente quente. A pasta virou “creme relaxante” e o
pente quente virou chapinha e a “moda” não passou!
O padrão de beleza imposto na sociedade brasileira era e
continua sendo o padrão eurocêntrico, com cabelos lisos, quadris finos, “traços
finos” (entre aspas porque acho esta expressão ridícula), enfim tudo que
remeta a branquitude que é colocada com a máxima de beleza (e não é). Entrar em
transição e assumir um cabelo crespo (e neste texto eu não estou falando de
assumir cachinhos dourados do filme ok?) é um ato político, um afrontamento a
todos estes padrões além do que, o que a sociedade tolera são os cachos, não os
crespos!
A HISTÓRIA PESSOAL
A minha primeira transformação química nos cabelos foi aos
dez anos de idade. A minha mãe fazia relaxamento e logo que eu tomei uma idade “aceitável”
tive os cabelos relaxados. Para ela era muito difícil, trabalhoso cuidar, muito
cabelo, era complicado de pentear porque eu chorava e reclamava muito afinal dói
a beça pentear cabelo crespo seco ou quase seco, então relaxei e aquele cabelo
que “nem pente entrava” ficou mais “baixinho” e comportado. Já dava para eu me
virar sozinha às vezes e aquilo era um milagre, porque eu realmente
tenho muito cabelo (já tinha naquela época) e era muito difícil arrumar todos
os dias antes da escola.
Aos 12 anos eu já fazia relaxamento todo mês e minha maior felicidade era quando escovava o cabelo, sentir ele balançando ao vento era incrível quase como as princesas dos filmes que eram todas de cabelo liso (inclusive as negras). Com 15 anos eu decidi que o relaxamento de guanidina já não era o suficiente, ainda ficava volumoso e eu podia até ter cabelo crespo, mas para o alto não. Não mesmo! Saí da guanidina para o hidróxido de sódio e a primeira aplicação ficou LINDO (lindo mesmo), eu tenho o cabelo tipo 4a, b, c e ele ficou algo parecido com um cabelo 3b. Isto só na primeira semana pois como toda química não dá um efeito natural de verdade, com o hidróxido de sódio não deveria ser diferente. Quando a raiz começava a inchar lá corria eu para aplicar SOZINHA mais um pouco de hidróxido na raiz e o que aconteceu? QUE-BROU! Não era difícil de imaginar que eu ficaria careca usando este alisamento fortíssimo, sozinha e num prazo pequeno, depois disso meu cabelo nunca mais prestou para NADA! Fui então para a progressiva porque pelo menos ficaria liso. Não, não ficava liso! Todos os cabeleireiros sempre me juravam que com o produto deles eu não precisaria escovar e pranchar somente “bater o secador” como dizem aqui! Às vezes eu fico achando que era bater mesmo o secador na cabeça (risos) porque nunca dava certo! Progressiva em cima de progressiva e isso seguiu por 7 anos. Em 2011 eu fiquei grávida e mesmo grávida eu não consegui ficar sem relaxar, fiz uma vez durante a gravidez para “me sentir mais bonita” (você me deve isto, sociedade racista e preconceituosa nojenta) apesar de não ser aconselhado por nenhum médico. Amamentando fiz de novo, sob a mesma justificativa ainda não sendo recomendado. Lembro que em meados de 2013 eu tive a vaga sensação de que poderia parar de alisar e cuidar dos meus “cachos” e a cabeleireira foi taxativa em me aconselhar: “cachos? Que cachos minha filha? Esse cabelo duro não faz cachos, tem que alisar isso aí” seguido de risadinhas para soar como brincadeira. Eu fiquei me sentindo um lixo naquele dia, mas sorri porque eu também acreditava que meu cabelo era duro e a única coisa que daria conserto nele seria a santa progressiva dela!
Aos 12 anos eu já fazia relaxamento todo mês e minha maior felicidade era quando escovava o cabelo, sentir ele balançando ao vento era incrível quase como as princesas dos filmes que eram todas de cabelo liso (inclusive as negras). Com 15 anos eu decidi que o relaxamento de guanidina já não era o suficiente, ainda ficava volumoso e eu podia até ter cabelo crespo, mas para o alto não. Não mesmo! Saí da guanidina para o hidróxido de sódio e a primeira aplicação ficou LINDO (lindo mesmo), eu tenho o cabelo tipo 4a, b, c e ele ficou algo parecido com um cabelo 3b. Isto só na primeira semana pois como toda química não dá um efeito natural de verdade, com o hidróxido de sódio não deveria ser diferente. Quando a raiz começava a inchar lá corria eu para aplicar SOZINHA mais um pouco de hidróxido na raiz e o que aconteceu? QUE-BROU! Não era difícil de imaginar que eu ficaria careca usando este alisamento fortíssimo, sozinha e num prazo pequeno, depois disso meu cabelo nunca mais prestou para NADA! Fui então para a progressiva porque pelo menos ficaria liso. Não, não ficava liso! Todos os cabeleireiros sempre me juravam que com o produto deles eu não precisaria escovar e pranchar somente “bater o secador” como dizem aqui! Às vezes eu fico achando que era bater mesmo o secador na cabeça (risos) porque nunca dava certo! Progressiva em cima de progressiva e isso seguiu por 7 anos. Em 2011 eu fiquei grávida e mesmo grávida eu não consegui ficar sem relaxar, fiz uma vez durante a gravidez para “me sentir mais bonita” (você me deve isto, sociedade racista e preconceituosa nojenta) apesar de não ser aconselhado por nenhum médico. Amamentando fiz de novo, sob a mesma justificativa ainda não sendo recomendado. Lembro que em meados de 2013 eu tive a vaga sensação de que poderia parar de alisar e cuidar dos meus “cachos” e a cabeleireira foi taxativa em me aconselhar: “cachos? Que cachos minha filha? Esse cabelo duro não faz cachos, tem que alisar isso aí” seguido de risadinhas para soar como brincadeira. Eu fiquei me sentindo um lixo naquele dia, mas sorri porque eu também acreditava que meu cabelo era duro e a única coisa que daria conserto nele seria a santa progressiva dela!
O EMPURRÃOZINHO QUE FALTAVA
Em dezembro de 2014 eu conheci uma garota que havia acabado
de desistir da transição e foi ela (por incrível que pareça) que me apresentou
ao mundo do cabelo natural! Me mostrou vídeos, tutoriais, me ensinou a fazer
fitagem e me apresentou uma vloger famosa que de empoderada não tem nada, mas
arrasa nas dicas para os cabelos cacheados! A blogueira em questão usa química
então eu pensei que poderia usar algo levinho ou um permanente afro para ter os
tão sonhados “cachos da moda”. Quando eu entrei em transição eu não sabia ainda
a real dimensão daquilo que estava me arriscando a fazer, durante toda a
vida mudei de cabelo na hora que quis (e como a sociedade impunha) e na minha
cabeça aquilo seria só mais uma mudança talvez radical, mas não que mudasse
tanto a minha vida de alguma forma. Depois de conhecer a vlogueira famosa, eu
fui procurar no Facebook alguma luz, ou talvez uma ou duas meninas que estivessem passando por aquele mesmo momento para me aconselhar. Foi neste
momento que encontrei o grupo (famoso) Cacheadas em transição que nessa época
não tinha mais de 10.000 meninas eu acho (o que é pouco em vista das mais de 100.000
que tem hoje) e descobri que isto era uma realidade, tinha muita gente
quebrando os padrões!
RECONHECIMENTO
No grupo das cacheadas havia muitas meninas empoderadas e
que naquela época tinham muito mais voz, eu li e vi muitas discussões
bacanas de negras realmente conscientes de que deixar de alisar o cabelo é
muito mais que estética, é confrontar todos os padrões que mencionei no começo
deste texto é dizer para a sociedade “EI, FODA-SE” e para mim, foi o momento de
decidir que eu não queria a moda dos cachos, eu queria a liberdade dos meus
cabelos. Era preciso fazer uma análise de dentro, buscar lá nas memórias tudo
que eu havia absorvido e encarado como depreciativo na minha estética. E não
vou falar que foi fácil porque não foi, a sensação de cair na real neste
assunto é assustadora! Você acaba percebendo e lembrando de diversas
situações em que você foi confrontada com o racismo e não havia percebido, este choque de realidade é assustador! Por isso eu sempre digo para as pessoas
que pensam em algum momento entrar em transição “preparem o psicológico porque
a parada é pesada e dolorida”.
TRANSIÇÃO INTERNA, POR ONDE COMEÇAR?
Este post corria sério risco de ficar imenso porque eu realmente tenho muito a dizer sobre isto, mas por hora é só! O que realmente precisa ser discutido e escancarado é que ao contrário do que a mídia de massa insiste em pregar, entrar em transição e assumir seu cabelo crespo não é uma "moda" ou uma "onda" entre as mulheres negras, isto é sim um ato político de afrontamento e resistência ao sistema de opressão a estética negra que está implantado a anos no nosso país!
Resistamos e sejamos fortes pois nós somos as referências que não tivemos quando éramos crianças.
Abraços a todos e voltem sempre ao blog!
Muito linda sua história .Quando entrei em transição capilar também entrei em transição política.Descobri o feminismo negro e a luta das nossas mulheres por igualdade e direito de ostentar nossas características negras sem medo .
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